É verdade que o sistema de seguridade social vem sendo alterado, sempre para pior, desde a década de 1990, nunca houve uma proposta tão agressiva como agora. Mesmo que o relatório da CPI da Previdência Social diga que “tecnicamente, é possível afirmar com convicção que inexiste déficit da Previdência Social ou da Seguridade Social”. Em função disso, era tão aguardada a ida do ministro da economia, Paulo Guedes, à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara para prestar esclarecimentos sobre a proposta de reforma da Previdência.

Oito dias após cancelar sua ida a CCJ, com a justificativa de haver se incomodado com o adiamento da indicação do relator da proposta na comissão, o que gerou críticas por parte de deputados da oposição e até mesmo de integrantes da base aliada, o Ministro finalmente compareceu a Câmara na última quarta-feira (3). Embora o tema seja de grande importância, a sessão foi marcada pela presença de poucos líderes de partidos e por momentos de tensão.

O ministro mais uma vez, taxou os trabalhadores e trabalhadoras do serviço público como “privilegiados”, disse que o principal componente do problema de dimensão fiscal da Previdência é o gasto com pessoal. Ele citou como exemplo “o crescimento acelerado de salário do funcionalismo”. Os servidores estão na mira de Guedes, que no último dia 25 de março, o ministro fez uma ameaça ao funcionalismo e afirmou que a interrupção do pagamento de salários de servidores será a “primeira coisa a acontecer”, caso a reforma da Previdência não seja aprovada.

Em outro momento polêmico os deputados começaram a questionar Guedes sobre o Chile, em referência ao modelo de capitalização proposto pelo ministro que se assemelharia ao do país latino. Guedes respondeu: “E o Chile? Na Venezuela deve estar melhor”, ironizando. O ministro também afirmou que os governos anteriores deram incentivos para a JBS e que “tiveram 18 anos no poder e não tiveram coragem de mudar”, quando foi questionado a tributação de dividendos.

A audiência foi encerrada após mais de seis horas de duração, depois de uma confusão que se formou quando um deputado afirmou que o ministro age como “tigrão” em relação a aposentados, idosos e pessoas com deficiência, mas como “tchutchuca” em relação à “turma mais privilegiada do nosso país”. A troca de farpas embora seja comemorada por alguns sites não ajudou muito, e a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), segue analisando se a proposta está de acordo com os preceitos constitucionais.

Próximos passos

Após essa análise da proposta, se o texto estiver de acordo com os preceitos constitucionais, a CCJ terá que votar um parecer. Se a proposta for aprovada será criada uma Comissão Especial formada por deputados para discutir o mérito da PEC. É nessa fase que os deputados poderão sugerir mudanças no conteúdo por meio de emendas. A comissão terá o prazo de até 40 (quarenta) sessões para votar um parecer, a ser apresentado pelo relator escolhido.

Se aprovada pelo Colegiado, a PEC segue para votação no plenário da Câmara, onde precisará do apoio de ao menos 308 (trezentos e oito) dos 513 (quinhentos e treze) votos, em 2 (dois) turnos de votação.

CPI da previdência de 2018

O relatório final da CPI da previdência foi aprovado no dia 25 de outubro do ano passado. Mas por que não vimos nenhuma linha nos jornais impressos e online ou matéria nas TVs ao menos para registrar o fato? O motivo pode ser a revelação de que as empresas privadas devem à Previdência Social R$ 450 bilhões. Sonegação do imposto que na maioria das vezes é cobrado do trabalhador, mas não repassado para a Receita Federal, que faz o recolhimento do tributo.

Como as entidades sindicais e inúmeros estudos apontam, não há déficit e parte importante do valor arrecadado é utilizada para pagar outras dívidas, através da Desvinculação das Receitas da União (DRU). A CPI mostrou ainda que é possível aumentar o valor dos benefícios. Para isso, basta criar mecanismos de combate às fraudes, ter mais rigor na cobrança dos grandes devedores e estancar o desvio de recursos para outros setores, para que tudo funcione de maneira inclusive a economizar recursos para o Estado.

Aumento de receita sem penalizar o trabalhador

A questão da Previdência tem motivado estudos e pesquisas, segundo os economistas José Dari Krein e Vitor Araújo Filgueiras, que seria possível aumentar a receita da Previdência Social com o mero respeito à lei trabalhista. Sem mencionar a sonegação institucionalizada através de acordos realizados todos os dias na Justiça do Trabalho, lançando verbas salariais como indenizatórias apenas para que não incidam encargos previdenciários.

Segundo eles a formalização do trabalho assalariado sem carteira assinada resultaria receita de R$ 47 bilhões; o fim das remunerações “por fora” resultariam mais R$ 20 bilhões; o reembolso pelas empresas das despesas com acidentes de trabalho e a extinção do enquadramento de acidentes de trabalho como doenças comuns, resultaria em mais de R$ 25 bilhões.

Eles apontam, ainda, que apenas em 2014 foram extraídos do patrimônio da classe trabalhadora: R$ 1,1 bilhão, com isenção para a Fifa; R$ 2,1 bilhões, em desvios na Petrobrás; R$13,2 bilhões, com desonerações na folha de pagamento; R$ 2 bilhões, não recolhidos nas lides trabalhistas e o dado mais impactante, R$ 104 bilhões, em isenções tributárias. Além disso, o mecanismo das Desvinculações de Recursos da União (DRU), vem desviando, para o pagamento da dívida pública, receitas que seriam da Seguridade Social. Só em 2015, essa desvinculação foi da ordem de R$ 63 bilhões.

Leia o texto original da Reforma encaminhado pela presidência ao congresso em fevereiro de 2019. O texto segue em análise pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados.

Abaixo-assinado e mobilizações

As centrais sindicais lançaram nesta quinta-feira (4), um abaixo-assinado contra a reforma da Previdência. As entidades de representação sindical de todo o país devem participar ativamente para coletar assinaturas em todo o país contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 06/19 e em favor da Previdência Social e da Aposentadoria. Após as assinaturas, as centrais sindicais irão entregar o documento ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia.

A ação faze parte do calendário de ações contra a reforma da Previdência e busca mobilizar os trabalhadores e trabalhadoras, rumo à greve geral, além de esclarecer a população o quanto a proposta é perversa.

Outras ações previstas para os próximos dias são:

  • Dia 16 de abril – ação conjunta dos dirigentes sindicais junto aos parlamentares no aeroporto de Brasília;
  • Dia 26 de abril – greve nacional dos professores, organizar em todo o país a solidariedade à greve;
  • Dia 1º de maio – atos unificados em todo o país, em Defesa da Previdência Social e da Aposentadoria.