Depois de ter sua discussão adiada, os turnos contínuos da UFRN voltaram a ser pauta do Conselho Administrativo (Consad), tendo como desfecho sua regulamentação por meio de resolução aprovada na reunião do último dia 03 (quinta-feira).
A jornada de trabalho de 30h, sem redução de salário, é uma reivindicação antiga dos técnico-administrativos e que vem sendo discutida em reiteradas greves como luta principal, especialmente na pauta interna das universidades. Na UFRN, a implantação dos turnos contínuos vinha sendo debatida de forma mais concreta desde 2014, quando uma comissão composta por servidores e administração central foi criada com objetivo de estudar o tema.
Em novembro de 2014, com o aval da categoria após uma assembleia geral, foi protocolada junto à UFRN a proposta de implantação dos turnos contínuos que trabalhava a ideia aos poucos, almejando que em dado momento todos tivessem as 30h. Essa proposta ficou engavetada pela reitoria da UFRN por mais de um ano, embora esse tenha sido um dos pontos principais reivindicados durante a greve (tanto nacionalmente, como localmente).
Em 2016, o debate foi trazido para pauta do conselho como fruto da audiência realizada no fim do ano passado entre a nova direção do SINTEST/RN e a administração da UFRN. Abaixo, em itálico, seguem informações sobre a resolução, de acordo com a assessoria da UFRN. Nós procuramos o documento original no site da instituição, conforme orientado, mas não o encontramos disponível, sendo a última resolução disponibilizada a de número 007/2016, de 18 de fevereiro.
Sobre a resolução (Com informações da UFRN)
Segundo a UFRN, a resolução aprovada foi amparada nos princípios da Administração Pública presentes na Constituição Federal, na autonomia da UFRN, na Lei n. 8.112/1990 e nos Decretos n. 1.867/1996 e n. 4.836/2003. A jornada de 30h será concedida nos seguintes casos:
- Quem atende o público em serviço contínuo de turnos ou escalas, em período igual ou superior a 12 horas ininterruptas, ou em expediente noturno com horário que vai além das 21 horas;
- Para servidores que trabalham em setores com quadro de pessoal suficiente para realizar os serviços de modo regular, sem comprometer a qualidade.
Vale ressaltar que o documento faz duas ressalvas: a jornada de 6 horas de trabalho não gera direito adquirido e, quando necessário, o servidor será previamente convocado a cumprir 8 horas diárias.
Como requerer
A jornada diferenciada é autorizada somente pelo plenário do Consad, via processo administrativo do servidor contendo: 1) Justificativa do dirigente da Unidade Acadêmica sobre a necessidade dos serviços do setor em turnos ininterruptos, evidenciando o fluxo de atendimento, público usuário e quantificação nos últimos três meses; 2) Proposta de escala de trabalho contendo nomes dos servidores e horários a serem cumpridos; 3) Quantitativo de servidores capacitados a executar as atividades e serviços para o público usuário; e 4) Plano de melhoria dos processos de trabalho da unidade de serviço junto com o termo de responsabilidade, no qual o servidor se compromete com a qualidade no atendimento.
O anexo 1 da resolução descreve os cargos efetivos de 20 categoriais profissionais com jornadas de trabalho diferenciadas por leis específicas (portarias do Ministério do Planejamento e Orçamento e Gestão (MPOG) 1.100/2006 e 222/2008, a Lei n. 12.317/2010) e a Lei n. 12.317/2010), a saber:
Médico – 20 horas semanais;
Médico de Saúde Pública – 20 horas semanais;
Médico Veterinário – 20 horas semanais;
Fisioterapeuta – máximo de 30 horas semanais;
Terapeuta Ocupacional – máximo de 30 horas semanais;
Fonoaudiólogo (Código NS 909 ou LT-NS 909 PCC/PGE) – 30 horas semanais;
Odontólogo – 30h semanais;
Jornalista – 25 horas semanais;
Músicos profissionais – 05 horas diárias semanais;
Magistério – 20 ou 40 horas semanais;
Técnico em Assuntos Culturais (Especialista em Musica) – 30 horas semanais;
Auxiliar em Assuntos Culturais (Especialista em Musica) – 30h semanais;
Técnico em Radiologia – 24 horas semanais;
Técnico em Laboratório (admitido até 16/02/1976 e optante pela jornada) – 30 horas semanais;
Laboratorista (admitido até 16/02/1976 e optante pela jornada) – 30 horas semanais;
Auxiliar de Laboratório (admitido até 16/02/1976 e optante pela jornada) – 30 horas semanais;
Radialista (Autoria, Locução) – 05 horas semanais;
Radialista (Produção e Técnica) – 06 horas semanais;
Radialista (Cenografia e Caracterização) – 07 horas semanais;
Técnico em Comunicação Social (Jornalismo, Especialidade em Redação, Revisão e Reportagem) – 25 horas semanais.
Importância das 30 horas
Os benefícios para a melhoria do serviço público em geral, bem como para o atendimento à sociedade é o mais latente com a adoção dos turnos contínuos, viabilizando as 30h. São 12 horas ininterruptas de atendimento, onde fica comprovada a maior efetividade dos serviços prestados. Mas queremos nos focar no benefício ao trabalhador.
Segundo o Ministério do Trabalho “Jornada de Trabalho normal será o espaço de tempo durante o qual o empregado deverá prestar serviço ou permanecer à disposição do empregador, com habitualidade, executadas as horas extraordinárias. Nos termos da CF, art. 7º, XIII, sua duração deverá ser de até 8 horas diárias, e 44 horas semanais.”
A perda dos direitos trabalhistas tem sido uma constante nos últimos tempos, bem como a tentativa do aumento destas perdas. Podemos citar a “Reforma Trabalhista” que os governantes vem tentando implementar, sem sucesso, até o momento. Junto a isso, vemos um crescimento avançado do trabalho informal, chegando ao patamar de 50%, e uma queda na força da união dos trabalhadores, impedindo que eles consigam se organizar para defesa de seus direitos.
A luta pela Jornada de 30 horas leva os trabalhadores, através dos seus sindicatos ao retorno da postura ofensiva. É uma reforma do trabalho progressista e tem vários objetivos e razões de ser. Como exemplo citamos um dos pontos principais: a diminuição do desemprego obrigando as empresas e instituições a contratar mais.
A diminuição da Jornada de trabalho, desde o século XIX, sempre foi um dos enfrentamentos mais difíceis que os trabalhadores tiveram com os patrões, de todo o tipo. De um lado, os patrões querem explorar ao máximo a mão de obra humana viva, tirando sempre lucros enormes com isso. De outro, os trabalhadores explorados, que sempre lutaram para que essa exploração fosse menor, com objetivo de possuir uma parcela maior de suas vidas, tragada pelos patrões em virtude das exaustivas jornadas de trabalho.
A diminuição da jornada de trabalho não atinge somente os trabalhadores empregados, mas tem ligação direta com o crescente número de desempregados. Nos setores de serviços, por exemplo, a diminuição da jornada de trabalho, deve estar atrelada a uma bandeira de “não diminuição do horário de atendimento ao público” , o que vai ocasionar a necessidade de uma contratação maior de funcionários. Esta deve ser uma bandeira forte, imediata, estratégica e necessária para diminuir, efetivamente, o empobrecimento e o desemprego.
A busca por uma Jornada de 30 horas é uma luta humanista pelo direito do ser humano de libertar do processo alienante de produção dentro da sociedade capitalista. Devemos lembrar que essa luta é defendida sem que ocorra diminuição de remuneração, o que leva a outras razões pela defesa das 30 horas: aumento relativo do valor da remuneração da força de trabalho.
História – Passado
Historicamente, as jornadas de trabalho já foram de 16 à 18 horas. Com o tempo, foram sendo reduzidas para 14, 12, 10, até chegarmos a atualidade de 8 horas de trabalho. Foi a força motriz à vapor, e depois o carvão, que marcou o fim do período das manufaturas e do sistema gremial possibilitando assim, o surgimento da grande indústria produzida em série. Com o advento das máquinas tudo foi sendo modificado na vida do trabalhador. Criou-se a possibilidade de vários operários ao mesmo tempo produzirem numa velocidade bem maior que a do operário sozinho. A indústria artesanal foi sendo substituída por grandes fábricas surgindo pela primeira vez a divisão do trabalho industrial.
A facilidade das tarefas a movimentos mecânicos repetitivos leva os industriais a empregarem mulheres e crianças. Para não morrer de fome, em condições extremamente miseráveis, os trabalhadores trabalhavam quase sem pausa. A jornada de trabalho fixa não existia. Muitos dormiam na própria fabrica e não era estranho jornadas de 16, 18 horas para ganhar o suficiente para sobreviver.
História – Hoje
Até hoje percebemos que a sociedade moderna não se libertou dessa paranoia de produção. Na verdade, ela nem se quer se deu conta dessa realidade. Os conceitos de ética, moral, bem e mal estão relacionados ao homem encaixar-se ou não como um “parafuso na máquina produtiva”. Aqueles que não se enquadram nesse padrão são perseguidos e marginalizados por não darem sua parte na produção de valor. Essa “filosofia” nos faz lembrar que acabou o famoso “fetiche” pela profissão e pelo trabalho. Acabou a mágica e o prazer pelos mesmos. Segundo Marx, “a burguesia despiu de todas as atividades até aqui veneráveis e estimadas com piedosa reverência da sua aparência sagrada. Transformou o médico, o jurista, o padre, o poeta, o homem da ciência, em trabalhadores assalariados pagos por ela.”
Essa visão, onde a Jornada de Trabalho é vista apenas como meio de se ganhar mais e mais, famílias se desestruturam, pessoas adoecem e os consultórios estão cheios de crianças e adultos com problemas. Ainda, segundo Marx, “a burguesia arrancou à relação familiar o seu comovente véu sentimental e reduziu-a a uma mera relação de dinheiro.” Perde –se o conceito de felicidade. A felicidade dentro deste padrão de pensamento, só pode ser conseguida numa competição brutal, onde há o sorriso dos “vitoriosos” e a desumana alienação das vitimas de um processo de miséria imensa. Este valor sentimental, a “felicidade”, se baseia na escravidão assalariada, miséria, dor e na vida subumana da esmagadora maioria.
Beneficio
É nesse contexto que surge a luta pela Jornada de Trabalho de 30 horas! Na produção, no trabalho maquinal e sem prazer, o trabalhador não se realiza como pessoa. Ao contrário do servo ou do mestre da idade média, ele não controla seus meios de trabalho, e sim é controlado por eles.
Razões para que esta luta seja primordial e estratégica no movimento sindical:
– Lançar os trabalhadores na luta ofensiva, questionando a ordem capitalista alienante;
– Diminuir um pouco o desemprego nesta crise aguda e crônica em que vivemos;
– Melhorar um pouco mais as condições de vida dos trabalhadores, liberando mais tempo livre;
– Aumentar o salário real efetivo do trabalhador desde que ele tenha o mesmo salário por uma jornada menor;
Mas a maior de todas e fundamental é o questionamento da alienação do homem no processo de trabalho. Ou seja, um homem submisso horas e horas, numa labuta que lhe é alheia e que o vai esgotando, ano após ano, apenas para que ele tenha condição de ser remunerado para se reproduzir, comprar e produzir mais valor. E ter tudo isso como a “razão de existir de uma humanidade”.
Contra a alienação, o embrutecimento, a perda do sentido da existência humana, defendamos 6 horas de trabalho diário, 30 horas de trabalho semanal para toda a sociedade. Apenas o primeiro passo para um futuro no qual, com certeza, as pessoas não gastarão mais que duas ou três horas nas funções de manutenção da sociedade e terão todos os dias de toda a sua vida a seu dispor.
“A libertação dos trabalhadores só pode ser fruto da luta dos próprios trabalhadores.” Karl Max